
Limites na fixação da multa rescisória em locações “BTS”
Alterações na Lei do Inquilinato
*Por Daniel Cerveira
A Lei do Inquilinato sofreu alterações em 2012, dentre elas a inclusão do artigo 54-A e respectivos parágrafos. O parágrafo segundo do referido artigo estabelece que na locação para fins comerciais “na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado” a penalidade aplicável na hipótese de rescisão antecipada pelo inquilino não poderá ultrapassar “a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação”. No mercado, as locações desse tipo são conhecidas pela sigla “BTS”, oriunda da expressão em inglês “built to suit”.
Objetivo da norma
O objetivo principal da disposição acima é incentivar a realização de negócios imobiliários, através da proteção dos investimentos efetuados pelos proprietários e afins de imóveis urbanos.
Risco de distorções
Muito embora a intenção seja louvável, se interpretada literalmente e sem a devida análise do caso concreto, a norma legal em pauta poderá gerar distorções.
Desafios para os locatários
Do ponto de vista dos locatários, (entenda-se as empresas que exploram imóveis por meio de arrendamentos), nem sempre os planos ocorrem como o previsto. Ou seja, pode acontecer de um restaurante não conseguir formar a sua clientela, uma loja sofrer com baixo faturamento no local ou um centro de distribuição precisar ser desativado pela ausência de demanda.
Multas potencialmente proibitivas
Nessa linha, caso por extrema necessidade o locatário for obrigado a rescindir o contrato de locação, restará ao locador cobrar a multa competente. Ocorre que, a depender do valor do aluguel e do prazo de vigência a vencer, a penalidade poderá ser manifestamente proibitiva, no sentido de ser impossível de ser cumprida e ter a capacidade de acarretar na “falência” da companhia inquilina.
Imagine, por exemplo, um aluguel de R$ 100.000,00 e um termo de 10 anos ainda a ser respeitado – neste caso a multa ficaria no patamar elevadíssimo de R$ 12.000.000,00, partindo-se que o seu valor foi determinado em contrato de acordo com o teto legal.
Possível excesso em favor do locador
Por outro lado, é possível conceber situações de desequilíbrio em favor do locador. Considerando o exemplo acima e supondo que o locador dispendeu R$ 10.000.000,00 na aquisição ou reforma do imóvel, o valor da multa se mostraria excessiva.
Parâmetros da jurisprudência
A título de referência, a jurisprudência dominante estabelece que a multa em contrato de locação não deve extrapolar 03 aluguéis proporcionais ao período de ocupação. Ou seja, no exemplo colocado, o locador receberia a quantia investida, mais o equivalente a 20 locativos.
Previsão do Código Civil
Vale lembrar que o artigo 413 do Código Civil prevê a possibilidade de o juiz determinar a redução de multa, equitativamente, nas situações em que “a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio”.
Decisões divergentes do TJ/SP
O TJ/SP já se pronunciou sob o entendimento de ser cabível a diminuição da penalidade estabelecida em contrato de locação da modalidade “BTS” – vide apelação nº 1020899-95.2020.8.26.0100, 26ª Câmara de Direito Privado, com julgamento em 13/02/2025. De outro lado, constam decisões que inadmitem a revisão da multa, independentemente do contexto – vide apelação nª 1011093-55.2019.8.26.0008, 28ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP, com julgamento em 04/11/2020.
Importância do equilíbrio
Importante destacar que, ao cabo, a fixação de multas em níveis calibrados estimulará as empresas a desenvolverem os seus negócios por intermédio dos contratos de locação do tipo “built to suit”, o que refletirá positivamente em favor dos proprietários de imóveis e da economia como um todo.
*Daniel Cerveira é consultor jurídico do Sindilojas-SP
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